
Tiago Belé é graduado em Química pelo Instituto de Química (IQ) da Unesp, no câmpus de Araraquara. Segundo ele, o que motivou sua escolha pelo curso foi a grande curiosidade em “saber como as coisas funcionam”. Posteriormente, ele ingressou em um mestrado em Tecnologia Ambiental na Unicamp e, hoje, ele é doutorando e pesquisador associado na área de Reciclagem e Economia Circular de plásticos na FAU (Friedrich-Alexander-Universität Erlangen-Nürnberg), na Alemanha.
A pesquisa de Tiago é parte de um projeto maior, o “C-Planet”, um grupo de pesquisa focado em tornar o consumo de plástico mais sustentável. No grupo, há colaboradores de diversas áreas, desde Psicologia e Ciências Sociais a Engenharia de Materiais e Química.
Para o egresso, “a Química é uma ciência fascinante e claramente multidisciplinar”. Tiago conta que pode trazer soluções para problemas atuais, inclusive na área do Meio Ambiente. O objetivo da pesquisa de Tiago, é auxiliar a estruturar uma Economia Circular de plásticos, que é diferente do sistema linear que é utilizado atualmente.
“No sistema linear que utilizamos, a matéria prima é processada, vendida, utilizada até ser completamente descartada. Em uma economia circular, a matéria prima é resgatada na fase final de descarte, e utilizando métodos como reuso e reciclagem, é possível fechar o ciclo de vida do material. Daí vem o nome Economia Circular. Com tal sistema, a extração de matéria prima do meio ambiente, assim como o desperdício de produto final são reduzidos e, em um caso ideal, poderia chegar a zero”.
Com o avanço dessas pesquisas, a utilização de petróleo (matéria-prima) para a produção de plásticos poderia ser bastante reduzida. Tiago afirma que a melhor solução não é parar de utilizar plásticos, mas utilizá-los da maneira correta: “o plástico em si é um material importante em nossas vidas, utilizado na Medicina, alimentos e até produtos tecnológicos. Com uma infinidade de aplicações essenciais em nossa vida, a demonização desse material não é necessária. Por exemplo, se defende tanto a utilização do papel como um material sustentável, mas a quantidade de água e energia para se produzir o papel é maior que o utilizado para se produzir a mesma quantidade de plástico. É o mesmo caso para o alumínio”.
O químico atua para auxiliar a resolver problemas na reciclagem desses produtos. Ele explica que uma questão a ser solucionada é que conforme o plástico vai sendo reciclado, ele perde qualidade e adquire um “odor”.
Dessa forma, a maior parte dos plásticos reciclados acaba sendo utilizada no que é chamado em de “aplicações de baixo nível”, como materiais de construção ou sacos de lixo.
“Pesquisadores do grupo C-Planet buscam aumentar a qualidade do produto final, para que esse seja aceito no mercado de forma mais ampla. No meu caso, sendo um Químico com especialidade em Analítica, utilizo técnicas avançadas de separação e análise de compostos, trabalho na identificação de substâncias que dão cheiro ao plástico e em tecnologias que possam deixá-los sem cheiro. Com a implementação de uma Economia Circular para plásticos, muita coisa pode ser mudada para melhor”.
Pesquisas no Brasil e na Europa: a trajetória acadêmica de Tiago
Segundo o pesquisador, a graduação na Unesp foi “um processo enriquecedor”,
habilidades que ele utiliza até hoje, foram aprendidas de um modo sólido no IQ. O unespiano, logo na faculdade, buscou oportunidades internacionais de estudo.
Durante o curso de Química, ele conseguiu uma bolsa do “Ciências sem Fronteiras” para um ano de estudos na Hungria. Tiago conta que a sua percepção da realidade foi alterada após essa experiência, sendo um divisor de águas na sua vida. Além disso, a bolsa do programa foi necessária para que ele tivesse condições de pagar por seus estudos no exterior.
“Na Unicamp consegui uma extensão da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), para pesquisar por 6 meses na Universidade de Wuppertal (Alemanha), onde estudei como alguns contaminantes orgânicos se aderem à microplásticos presentes em água. Ao final do meu mestrado já estava participando de entrevistas para outras oportunidades no exterior. Fiz candidaturas de doutorado em universidades no Canadá, Suécia, Holanda e Austrália. Optei pela Alemanha pelas características do projeto e pelo encaixe das habilidades necessárias para o projeto e meu perfil profissional”.
Tiago também ressalta como políticas sociais podem transformar realidades. “A aplicação à bolsa do Ciências sem Fronteiras foi algo espontâneo. Logo depois eu sabia o que queria para mim: uma vida com maior qualidade, com uma valorização adequada da Ciência e do profissional científico e com uma previsibilidade maior do futuro em relação à segurança financeira”.
O cientista lamenta a atual situação de falta de investimento na educação e alerta sobre a situação de insegurança do “estudante-pesquisador”, pois há cortes constantes nas verbas. “Apesar de sermos a décima segunda economia do mundo, no ranking de desenvolvimento humano estamos na posição 84. É uma conta que não bate”.
Ele também comenta que gostaria de trabalhar no Brasil, para contribuir para a sociedade e intelectualidade brasileira, mas o ambiente político, social e a baixa quantidade de oportunidades o desanimaram. “Tanto políticos como a sociedade, em geral, não valorizam a Tecnologia e Inovação em Ciência”, declara.
Quando perguntado sobre quais dicas ele daria para estudantes que buscam uma carreira acadêmica, ele afirma: “planeje. Pense no futuro para os próximos 2, 5, 8 anos. Sei que fica difícil durante a graduação, mas logo depois você já começa a ter idéia das suas especialidades. Foque nelas e as estude com foco. Já comece a olhar posições que você ache interessantes e adquira antecipadamente as habilidades necessárias para aquela posição. Em um ano você consegue aprimorar muita coisa em si mesmo e pode se surpreender!”